O Coração que encontra o olhar infantil





Equipe:
Fernanda Abranches Araujo Silva
Grupo social:

Cláudia Soares Leite
claleite19@gmail.com

Escola Municipal Presidente Agostinho Neto
Rua Visconde Silva, s/nº Humaitá. CEP 22271-044, Rio de Janeiro – RJ

O projeto foi desenvolvido na Escola Municipal Presidente Agostinho Neto, no Humaitá, e teve como intercessora a professora de artes Claudia Leite, que dá aula para crianças da Educação Infantil ao Ensino Fundamental.

Algumas aulas eram iniciadas com literatura para introduzir a atividade, em outras a professora mostrava obras de artistas conhecidos. Muitas vezes ela elaborava material com colagens para fazer uma conexão entre o conteúdo introduzido e o trabalho pedido aos alunos. As crianças faziam muitos desenhos, alguns sobre recortes de revista ou pintavam com cola colorida.

Em uma de suas aulas Claudia retira de sua bolsa um quadrinho branco (formato A4 aproximadamente), desses em que escrevemos à caneta e apagamos, para passar o enunciado. Mostra também uma colagem feita por ela e trabalhos da turma anterior para exemplificar o que pretendia e as variações que surgiam a partir da liberdade de cada um em criar. As crianças deveriam escolher uma figura recortada e colar no papel branco. Iniciar um contorno em volta da figura, que poderia ir ganhando liberdade e ir além da forma inicial: “Tem que ter coragem, sair daquele caminho”. A intenção é fazer a figura “principal” ir se fundindo com os contornos e cores, perdendo peso em relação aos elementos introduzidos pelas crianças. “Cadê minha garrafa? Quase sumiu”.

A partir do conjunto de palavras que compõem o universo vocabular de Claudia, reconhecemos a Frase-Objetivo do projeto: “Eu preciso do olhar infantil para acontecer como professora”.

Sua intenção se exemplifica pelo relato abaixo, quando Claudia dramatiza movimentos das formas geométricas para passar o enunciado: ela retira de sua bolsa um papel preto com colagem, preso por um cabide de saia. Sobre o papel colou 3 formas geométricas: círculo vermelho, triângulo amarelo e quadrado azul. Ela contou uma história de uma bola vermelha usada que foi jogada fora e foi murchando, ficando com uma cara triste. Quando João, um menino de rua, a encontrou e pegou para si, a bola voltou a sorrir. Claudia diz que o círculo gosta de pular e dançar (ficando com rachaduras dentro), que o triângulo era uma menina com hachura sinuosa e um laço na cabeça, e o quadrado era um menino muito chato, que não gostava de dançar (ela dá passos largos mostrando o único deslocamento que o quadrado fazia, um passo para frente, para o lado esquerdo, para trás e para a direita, até “desenhar” um quadrado no chão). Ela então me explica o que está por trás da proposta: “estou trabalhando formas geométricas, cores primárias, linhas retas e sinuosas”.

Após realizar diversos experimentos, chegou-se ao Partido Adotado: Claudia queria atrair o olhar dos alunos para ela. Sendo uma professora itinerante e dando aulas em salas cheias de informação nas paredes, era importante que as crianças ficassem atentas ao material que ela elaborava, uma interface entre a arte “consagrada” e a potencial produção dos alunos em sala.

Confeccinou-se uma espécie de mural, em forma de coração, de lycra vermelha e borda jeans, com estrutura em arame e abertura no meio (para poder retirar de dentro material didático), que é colocado sobre a roupa, amarrado como um biquíni. Como acessórios são usados diversos grampos com pressão que prendem no mural-coração desenhos de alunos, livros de histórias infantis e principalmente as colagens/interfaces que Claudia cria.

Participar desse projeto foi uma oportunidade que me dei para realizar algo, para tomar coragem diante do “mundo do trabalho” no qual volto a transitar. Acolhida pela Ana Branco e pelo Vicente, iniciei com muita energia para recuperar o atraso em relação à turma. Tive a sorte de encontrar uma intercessora flexível e criativa, que me aceitou prontamente, assim como se abriu aos experimentos e dinâmicas exigidas pelo projeto.

Havia feito essa matéria há 19 anos e, apesar de na época não ter muita consciência do seu poder na minha formação, nunca esqueci a vivência com a professora Ana Branco e queria fazer tudo de novo, mais madura. Sabia que era na “Barraca” que deveria recomeçar a fundar as novas bases da minha vida profissional, agora casada e com dois filhos pequenos.

Voltei a “colocar a mão na massa”, construindo experimentos, desenhando, colorindo, ouvindo, me corrigindo, AGRADECENDO O APRENDIZADO. Corri para lá e para cá, me desdobrei, voltei a pegar ônibus, convivi com alunos e professores do CIEP, com meus colegas da PUC e tudo isso foi muito rico. Me vi trabalhando fora, comprometida e feliz com o resultado obtido. Meus filhos viram o que sou capaz de realizar fora do âmbito doméstico.

Agradeço à Claudia pelo fato de ter entrado no meu ritmo frenético para dar conta dos prazos, por sempre me receber com alegria e dividir suas aulas comigo, mesmo sem saber muito bem o quê eu para quê estava fazendo tudo aquilo. Claudia confiou no processo e esse foi o maior aprendizado, CONFIAR. Depois dessa experiência saí mais tranquila para uma viagem de 2 semanas, deixando meus filhos sob os cuidados de outras pessoas.

Avaliação do intercessor:

Sala de aula. Turmas cheias de alunos com expectativa em relação à aula e à atividade complementar. Artes. Induz que teremos cores, desenhos e liberdade de expressão. E muito movimento. Nesse contexto, recebo Fernanda, inicialmente, minha estagiária. Sou Professora de Artes Visuais e Pedagoga, e essa última profissão sempre atua primeiro. Assim, começo a explicar toda a rotina escolar. Só fui perceber que a minha "estagiária" tinha em mente um projeto a ser desenvolvido e que iria me ajudar dinamizando as aulas com um recurso. Relaxei e acolhi!

Vários momentos foram vividos sem compreensão objetivo final. Ah! O resultado foi surpreendente, inesperado e pouco provável. Ainda bem que não interferi em sua conclusão e não criei paradigmas. Fernanda foi entendendo minha vontade de destacar as imagens que uso como interface entre meus alunos e os conteúdos de História da Arte, conteúdos de um mundo muito distante dos meninos. É preciso valorizar as imagens, deixando os alunos sentirem, perceberem, e só então, elaborarem e construírem suas próprias imagens, seus símbolos, suas expressões.

Preciso que o aluno olhe para mim e ando pela sala para que todos alcancem as imagens. Como fazer isso em salas grandes e com crianças muitas vezes dispersas?

Recebo um “mural-coração” onde disponibilizo meu material que é essencial para compreensão da proposta da aula. O formato de coração comunga com a relação que estabeleço com meus alunos, a construção do saber através do afeto.

Já satisfeita, fico sabendo que posso receber outro mural. Pode usar material nobre? O veludo preto destaca, respeitando todas as informações que uma obra de arte contém, sem interferir na linguagem simbólica.

A minha “estagiária” estava ali para desenvolver recurso pedagógico, através de observação e sensibilidade, que fortalecesse o vínculo tão necessário para realização das minhas aulas. Obrigada, Fernanda!

Disciplina: DSG 1002
Turma: 1AC
Professores: Ana Branco e Luis Vicente

e-mail: ana.branco@rdc.puc-rio.br