Letícia Honório Parente CONCLUSÃO 2016.1



Biochip
Ana, eu não coloquei data em todas as gratidões de modo que só pude colocar aqui em algumas. Tenho um pouco a impressão de que as aulas me tocam mais do que consigo verbalizar em palavras e tenho pensando cada vez mais que a comunicação falada é quase impossível, além dos ruídos do mundo falta vocabulário que dê conta de transcrever o que se passa dentro da gente. Um beijo, Letícia.

Gratidões:
Agradeço a combinação de verduras e frutas que possibilitaram os sabores da aula de hoje. Às receitas, à Ana, ao calor da panela e às mãos que mexeram. À mãe terra e às plantas que nasceram da aula passada. Gratidão.

Agradeço a combinação de verduras e frutas que possibilitaram os sabores da aula de hoje. Às receitas, à Ana, ao calor da panela e às mãos que mexeram. À mãe terra e às plantas que nasceram da aula passada. Gratidão.

Agradeço as cores da abóbora, do repolho roxo, da maçã, da beterraba e do inhame. Aos sabores que eu reconheci. A textura da massa. As reflexões da aula de hoje e ao filme da próxima aula. Mudar a alimentação é reinventar o próprio corpo.

Agradeço à argila por ter me escutado e conversado. Pelo silêncio e pelas reflexões da aula de hoje. Ainda reverberam. Quanto ao filme, me abriu para um outro olhar esquecido: como as relações se curam.

Agradeço a corda de sisal por me ensinar o conceito de rede. Por lembrar do fato de que entramos e saímos de redes o tempo todo. Da diferença entre receber a outra rede e de entrar na nova rede, As redes se entrelaçam e andam juntas. 11/03/16

O que é você? Pra onde vai a teia? É desconfortável a corda e arranha a pele. O caminho: a teia é tempo. Outro tempo. A corda me imprimiu um tempo. Me colocou em estado de observação (e com tempo para observar), vi o caminho, adotei o ritmo da teia. Olhei e vi o que passaria despercebido se adotasse o ritmo das coisas cotidianas. Chegando lá fora: o desconforto da corda dá lugar à segurança e à liberdade. É possível experimentar o equilíbrio e compartilhar com o resto da corda o meu equilíbrio. A teia é orgânica. Despedida da corda: a corda já não é desconfortável. Sente-se falta da corda. É diferente sem ela. Deseja-se de novo a liberdade da corda, o outros ângulos que ela oferecia. “a corda imprimiu uma marca” e sente-se saudade do tempo da corda. Obrigada pelo tempo. Pela presença e também pela falta. Estar sem a corda também desperta para a existência da teia. 06/03/2016

Agradeço ao repolho roxo que vai colorindo o meu desenho e ao repolho branco que vai servir de tela e de alimento. Ao pote, a canoura e à experiência de criar hoje o que eu vou comer quando pronto na segunda. O tempo que se doa no preparo e a atenção fazem parte da experiência final. Gratidão.

Eu agradeço a soja que se transformou no queijo e também as múltiplas tonalidades de violeta que nasceram do repolho roxo. Os desenhos, as formas, as mãos que preencheram os copos. Agradeço aos sabores do queijo, aos legumes cortadinhos e à experiência. Gratidão

Minhas mãos ficaram laranja e a gente experimentou as outras possibilidades da cenoura. Cada forma carrega um gosto novo. A canoura é incrível. Pensar ou não pensar no desenho do prato e ir criando de acordo com o que vai surgindo do desenho. Aproveitar o que é dispensado e pensar o alimento levando em conta novas possibilidades. A cenoura é plural?

Filme Ponto de Mutação Achei o filme bastante interessante de modo que fiquei pensando nele nos dias que seguiram. Lembrei do livro “Mutações” da Liv Ullmann que também atua no filme e pensei nas hipóteses que levaram a escolha do título. Talvez a obra tenha se desdobrado dentro da atriz e se transformado no livro, talvez não. De todo modo, ele trouxe um olhar novo sobre determinados temas, o que é sempre muito rico. Gratidão pelo olhar.

Rami A experiência em grupo depois em dupla e por fim individual me mostrou que os níveis de dificuldade variam. Que encontrar pontos de equilíbrio em cada modalidade é diferente e que por vezes é assim mesmo. Gratidão pela experiência corda de Rami.

Reconhecendo as areias
Só a areia fina é passível do voo e da mudança. Só o que voa muda, a areia fina voa e alcança outros lugares. A areia fina é leve e maleável. Os pensamentos que me alcançam enquanto manipulo a areia fina pedem ajuda para serem também leves e maleáveis. Pensei em uma mesma história três vezes e na terceira a tranquilidade já tinha me alcançado. Aquilo que parece pesado e complicado é influenciado pela leveza e pelo deslocamento que só a areia fina é capaz de criar e eles também se deslocam e ganham novos caminhos. Quem faz os desenhos sou eu ou eles já estão escritos? Experimente fazer chover com a areia fina.

Desenho investigação com frutas
Perceber que a escolha das frutas é uma escolha racional, que existem frutas que devem ser combinadas e outras não, que se come também as formas e os desenhos que se fazem e que essa escolha depende da gente. Desenhamos oferecemos nossos pratos para os colegas de turma em um gesto de generosidade e amor. Oferecer é lindo, é um gesto de amor.

Bibliografia Acho que essa foi uma das aulas que mais mexeu comigo. A explicação sobre o fogo, ver o fogo como um elemento vivo da natureza, um agente renovador da vida. Percebo a nossa ignorância, a forma como somos mergulhados em verdades pré-estabelecidas e nunca questionadas. Em certezas sem pé nem cabeça ou conexão com a terra. Como ignoramos o conhecimento de quem estava aqui antes de nós, dos índios, da terra, da vida. A verdade pouco se encontra nos livros, a verdade na vida.

Filme Super Size Me Eu já tinha visto esse filme quando mais nova e ela já havia me causado repulsa. Não lembro quando foi que parei de comer em Mc Donalds, Bob’s e etc, mas já faz muito tempo. Comer nessas lanchonetes me deixava enjoada, com absoluto mal estar. Era como se eu estivesse me envenenando com uma comida que o meu corpo já sabia que não era boa. Mas acho absolutamente cruel que a nossa sociedade permita que essas redes criem lanches temáticos com brinquedos para atrais crianças. Quando criança eu adorava ganhar os brindes do Mc lanche feliz e sei que muitas crianças ainda são seduzidas por esses brinquedos. O Capitalismo permite isso, permite que a vida e a saúde de nossas crianças seja uma preocupação secundária, que o lucro dos empresários seja mais importante.

Balões Tudo o que eu sabia sobre os balões era o que a mídia me dizia. A mídia nunca me falou da conexão dessa atividade com a cultura popular, nunca me falaram das festas de São João nem do povo juntinho preparando os balões. Penso que é importante pra quem tá no topo da pirâmide que o povo se mantenha individualizado, separado, assim a manipulação é feita mais facilmente. Um povo que não pensa junto, não discute e não decide é um povo aberto a acreditar em qualquer ideia que surja se colocando como verdade.

Reconhecendo a terra
Essa aula foi muito interessante na medida que me mostrou as fases da terra e da vida. Em cada lata de compostagem existia um tempo e cada tempo existia uma forma de vida. A mais antiga era tão pequenina que os olhos não viam. A vida se renova, se transforma.

Hoje fiz canjica de banana. Resolvi começar esse texto contando isso porque sinto que o significado que esse ato carrega é muito maior do que eu conseguiria explicar de outra forma. Eu escolhi germinar o amendoim, precisei me programar pra isso algumas horas antes, comprei o coco, as bananas e decidi fazer em casa. Queria servir pra minha família inteira. Deixei guardadinho pra eles comerem depois e me dizerem se gostaram. Quero muito ouvir a resposta. Resolvi comprar o coco e eu mesma tirar a água e abrir no meio. Enquanto eu girava o coco e esperava que ele quebrasse, o coco teimava em não abrir. Eu fui ficando cansada até que, em um instante, quando eu já pensava em pedir ajuda, o coco rachou no meio. Lembrei das palavras da Ana de que era preciso ter fé. E era. Fiquei tão contente com o meu feito que todas as fases da receita foram sendo uma pequena aventura. Eu descobrindo que sou capaz, percebendo que posso fazer as minhas escolhas e ir com elas até o fim. Eu escolhi fazer a canjica, quebrar o coco e ralar porque era o que eu queria. Eu não sei cozinhar, com exceção de alguma coisinha rápida. Sempre achei natural a comida pronta enquanto eu me servia. Um dia desses resolvi fazer uma saladinha com coisas da minha cabeça, ia ser o meu almoço e acabou ficando ótimo. Eu tô falando e falando de comida mas o que na verdade eu quero dizer é que de alguma forma eu despertei pra esse meu lugarzinho no mundo, enquanto criatura, que antes só recebia mas que agora tem a necessidade também de dar. Se antes eu sabia comer, quero agora presentear os outros com a minha comida, com o meu carinho e tempo. Alimentar é de fato um gesto sagrado, é o tempo que se doa, a energia, a vida. Enquanto escrevo esse texto, tô na torcida pra alguém chegar em casa e experimentar a minha canjica. Quero dizer pras pessoas que ela não leva açúcar, que sim, ela tá muito gostosa e a receitinha é muito fácil, eles também podem fazer e servir pras pessoas queridas. Quero dizer que eu fiz porque gosto muito de todos que vivem comigo e queria oferecer pra eles. É muito difícil verbalizar essas coisas que são sentidas. Eu que não acredito nessa comunicação que se baseia na palavra, encoberta de ruído. Biochip foi uma chaminha de esperança, foi perceber que uma nova realidade é possível. O automatismo que a gente é imerso desde o nascimento e é obrigado a seguir vai nos envenenando aos pouquinhos e a gente fica convencido de que a realidade que a gente conhece é a única possível. Foi muito importante descobrir que existe uma outra alternativa. Ao menos agora eu sei o que eu não quero. Ainda não sei como alcançar o que desejo nem quais caminhos percorrer, mas eu já sei da importância de rezar, de passar o tempo com quem se ama, de perceber o que se come, de prestar atenção, de doar tempo e carinho. Biochip me afetou de muitas formas, e digo isso porque sinto que o resultado foi tão gigantesco que ainda não é possível dimensionar. É uma sementinha que tá germinando dentro de mim e que vai nascer um broto lindo.

Letícia Parente