Gratidões de Lara Barretto


Agradeço a corda de sisal pelo fato de trabalhar junto e criar um sistema apenas pelo movimentos, o que me fez enxergar com outros olhos pessoas desconhecidas. Isso gerou em mim um sentimento de confiança, empatia e vontade de ajudar o próximo e o ambiente em que estava, ou seja, de fazer a diferença em mim e no mundo.

É preciso enxergar a vida de outros ângulos e formar, para se sentir vivo. Também é preciso do outro para conseguirmos viver, pois sem eles, o sistema não funciona. O outro que digo, não é só o humano, mas a natureza, animais, ar, tudo vivo no planeta terra.


Agradeço a corda de sisal pelo fato de despertar diferentes movimentos e posições, por me trazer conforto e sorrisos ao lado de pessoas que não conheço.

Eu fui responsável por deixar o outro encontrar novas posições e ter novas experiências, o que me fez entender como o outro funciona por meio da tensão e movimentos inesperados. A vida é muito parecida com essa rede, porque precisamos do outro para se descobrir e ter novas experiências.

Quando entrei na rede de outro grupo, no início me senti estranha, pois acabei ficando muito dentro da roda. Mas não tem nada de errado em se sentir assim.. haverá certos momentos em que vamos precisar sair da nossa zona de conforto e experimentar algo novo. E nós temos que nos adaptar a esse novo ambiente, e nesse momento alguns irão ajudar e acolher, como foi o que aconteceu depois de não ter me “encaixado” no grupo.

Enquanto escrevo esse texto, percebi muitas formigas rondando a sala e nós somos como essas formigas. Somos todos pequenas formiguinhas tentando ajudar o outro e indo atrás de novas fontes de experiências. Somos formigas desbravadoras do mundo, um mundo que é tão gigante para nós.


Eu agradeço a cenoura por me fazer inventar diferentes formas para um alimento só. Agradeço pelo fato de me fazer experimentar diferentes sabores, vindo de um mesmo alimento. Agradeço pelo fato de mudar o meu paladar em segundos, ao colocar várias formas na minha boca. Não importa o desenho, o que o olho vê, porque no fundo quem vai sentir a cenoura é a boca, nosso paladar. Portanto, essa aula me trouxe uma reflexão sobre o fato de nem tudo que a gente vê, é realmente o que esperamos ser de verdade. Nossos olhos nos enganam muito facilmente.

Além disso, é incrível ver como as mentes, a imaginação das pessoas são tão diferentes e únicas. Percebi isso com as diferentes formas da cenoura que surgiram em cada prancheta. Nós somos muito distintos, até mesmo nas pequenas coisas e ações do nosso dia a dia. Essa é a graça do mundo, de cada um ter o seu jeito único de ver a vida.


Agradeço a corda de sisal de rami pelo fato de me tirar da zona de conforto e me fazer suar com tanto movimentos nesse verão carioca. As posições que experimentei não conseguiria sozinha, o que me fz refletir sobre como devemos para de falar e apenas sentir e experimentar a sensação do momento. Mesmo estando sozinha na corda, pessoas me ajudaram a encontrar posições confortáveis e diferentes das usuais.


Agradeço ao grão de aveia e amendoim pelo fato de me trazer paz de espírito ao tocas as minhas mãos. O contato com os alimentos que iremos comer, me despertou uma conexão com a terra, que há muito tempo não sentia. Esse momento me fez relembrar quando viaja para hotéis fazendas com a minha família quando era criança. Lá, colocávamos a mão na massa para cozinhar, como bolos, pão etc. Lembranças... parece que acendeu se acendeu em mim assim que comecei a amassar o pão de aveia e amendoim. Nem me recordava mais desses momentos de quando era criança.. e eram tão bons e tão únicos. Saudades dessa época. Acredito que quando comer o pão que fiz, a gratidão será muito maior.


Agradeço ao filme por me fazer refletir sobre como vivemos na sociedade hoje e como precisamos de pouco para ser feliz. O filme mostra aqueles que vivem em outro planeta vivem de verdade, olham no olho, plantam o que come, discutem com respeito, empatia. Aquela é uma sociedade utópica, que conseguiram evoluir dessa sociedade atual, que é muito individualista.

O filme trata a sociedade atual de forma sarcástica, mas que deve ser levado muito a sério, por mais que seja um filme antigo ele consegue tratar muito bem nossa sociedade de hoje. Como não temos mais rios? Onde está a terra e as árvores, que foram tomadas pelas cidades? Onde está a empatia do ser humano? Precisamos nos conectar mais com a terra, natureza para entender o que realmente precisamos para ser feliz. É basta pouco para ser feliz.

Além disso, comemos o pão com guacamole enquanto assistíamos ao filme. Nunca comi uma guacamole tão gostosa como aquela. Foi incrível ver o resultado do pão que fizemos na aula passada, estava durinho e saboroso!

Agradeço ao repolho e cenoura por me fazer sentir texturas diferentes e cores intensas, que juntas no pote formaram uma obra de arte. Isso despertou em mim um certo relaxamento e conhecimento, que podemos olhar os alimentos de diferentes formas.

Agradeço ao alimento por me provar que não devemos julgar nada antes de conhecer de fato. Confesso que quando levei o pote de repolho e cenoura para casa, fiquei em dúvida sobre o fato de comer aquilo na aula seguinte. Não tinha um cheiro muito agradável e seu aspecto não era muito bonito. Quando a Ana terminou o queijo de temperar o queijo e o repolho, vi a beleza das cores e o cheiro estava incrível, muito diferente daquele que estava dentro do pote no dia anterior. Isso me fez querer experimentar a comida. E quando experimentei estava completamente errada sobre minhas percepções iniciais. Tudo estava tão gostoso que repeti e pretendo fazer em casa. Assim, o meu principal aprendizado foi: experimente antes de julgar as coisas. Se arrisque mesmo com seus julgamentos. Nada é da forma que pensamos que é e no final você pode se surpreender!


Agradeço a areia por me trazer tranquilidade em um momento/dia de muito estresse. A areia me controlou, por mais que eu pensasse no que iria desenhar. As formas criadas foram únicas e de uma leveza enorme. Ela é tão leve que me fez sentir leve também.

Só consigo lembrar da sensação dela passando em minhas mãos e dedos como uma pluma. Essa conexão me fez meditar de certa forma, principalmente no momento em que deitei e passei mexer nela sem vê-la. Esse momento foi o que estava mais relaxada, pois estava sentindo 100% o momento. Enquanto, na hora sentada estava preocupada com a arte que estava desenhando.

Nem sempre os nossos olhos dizem e sentem tudo. Às vezes precisamos ficar “cegos” para sentir de verdade o momento. Obrigada areia por me ensinar que basta pouco para relaxarmos em um dia estressante.


Agradeço a terra pelo fato de me fazer refletir sobre a vida e morte. Percebi que quando morremos, nós não morremos, nós evoluímos, criamos vidas. Eu sempre quis ser cremada, nunca gostei do fato de ficar dentro de um espaço minúsculo e apertado quando morresse. E então percebi que agora quero ser enterrada e que plantem uma semente em cima de mim, para no final virar uma árvore bem bonita.

Quando peguei o gongolo na mão, confesso que fiquei com muito nervoso, mas depois comecei a gostar da sensação de cosquinha que suas patinhas faziam. E na minha casa, por ter muita natureza ao redor, acaba que surgem muito gongolos e sempre tive um pouco de nojo. Mas depois dessa aula percebi que não temos que ter nojo, eles são uma parte da natureza e melhoram a qualidade da terra. E sem terra não existiríamos, logo, o gongolo deve ser valorizado por todos nós. Engraçado isso, não valorizamos pequenas coisas do nosso dia a dia.. se não existissem, nós não estaríamos aqui hoje.

Obrigada por me fazer reconhecer o que é a morte e como devemos valorizar tudo, até mesmo a morte. Temos que gradecer todos os dias por isso.


Eu agradeço a chuva e a fogueira por ter me acolhido no meio ao frio do inverno carioca. A fogueira me esquentou da cabeça aos pés, assim como a Ana ao contar suas histórias para nós. Suas falas e livros me instigaram a ir atrás desse conhecimento vivo.

O fogo também é algo vivo e que permeia sobre nós. Ele queima as coisas ao seu redor, mas ele permanece intacto ali, queimando a sua brasa e nos esquentando. Ele é forte e sua cor é viva. Viva com o laranja e amarelo que se mesclam, que se transforma em uma forma única no ar. Essa forma que não é tocável, mas que é linda de ver em movimento. Parece uma dança. E nós estávamos ali, vendo a dança do fogo queimar as folhas e madeiras, escutando a experiência e conhecimento de vida da Ana.


Agradeço às conchas pelo fato de me acalmarem e se tornarem minhas amigas. O seu som, quando misturadas, formam o som do mar com a sua calmaria.

Muitas delas estavam quebradas e em pedaços, mostrando as suas histórias tão únicas. Mas mesmo assim as ondas do mar deixaram belas, principalmente quando estavam perto das outras. Juntas, elas formavam algo maior e mais bonito aos olhos.

Em várias tinham um furinho no meio e o furo era tão perfeito, redondinho mesmo. Isso mostra o seu passado, que já foi a casa de alguém. E agora estava sendo parte de mim a partir do momento em que me conectei com elas. Cheguei a colocar em meus olhos e consegui ver de outra forma as coisas ao meu redor por meio daquele furinho tão pequeninho.

O degradê e as diferentes formas e texturas parecem que foram feitas propositalmente pelo mar. Como se o mar fosse seu criador. Mas ele é. Ele deixa as conchas mais amorosas e doces com o seu vai e vem da água salgada. Engraçado isso, elas vêm de um ambiente salgado e forte, mas se transformam em algo doce, suave e leve.

Obrigada por me fazer criar e por ser do tamanho dos meus dedos, mãos, por ter feito parte de mim nesse momento.


Agradeço a argila por me deixar leve e me fazer experimentar diferentes sensações. Ao mesmo tempo leve, pesado. Ao mesmo tempo liso, áspero. Ambiguidades presentes em único objeto.

Acho que a ancestralidade presente na argila me fez conectar comigo mesma e me relaxar. Me fez não pensar em nada além de sentir o momento. Em certo momento não conseguia mais tirá-la da minha mão, não tinha mais como. Ela já era eu, eu já era ela. Ela era parte do meu corpo agora, da minha pele, do meu espírito.

Obrigada por me mostrar que coisas pequenas do dia a dia, que estão tão perto de nós, podem ser tão importantes. Argila, agora somos uma só e não quero te deixar.


Agradeço a canjica de amendoim com banana por ter me unido a pessoas nesse último momento do curso. Obrigada por me fazer perceber que podemos desconstruir tudo que é imposto pra gente.

Ela não é igual a canjica tradicional, mas quem disse que não é uma canjica? Cheguei a me questionar pelo fato de não ter milho e não é que ficou melhor ainda. Isso sim era uma canjica de festa junina e há quem diga que não.

Essa foi a primeira aula que cheguei cedo. Fui uma das primeiras a entrar na tenda, antes mesmo da Ana e Luiza. Foi uma sensação de vazio e preenchimento ao mesmo tempo. Consegui observar mais detalhadamente cada coisinha na sala, como ela era viva mesmo sem pessoas ali dentro. Conforme as pessoas chegavam, vinham dando mais vida ainda a esse lugar tão especial. As pessoas transformam tudo, o ambiente, o ar, a energia. E sinto que Biochip foi assim do início ao final. Se foi especial, foi com certeza por causa das pessoas que estavam ali em um prol em comum: abrir a mente e se deixar conectar.


Agradeço à festa da prova por me tirar completamente da minha zona de conforto, já que fiz um prato vivo sozinha e também tive que falar sobre a minha experiência na frente de todos.

Ver como cada um ali dentro foi afetado pelas aulas me encantou e me fez querer correr mais atrás disso. Tantas histórias e reflexões, tanta gente diferente entre si, se encontrando em um sábado à tarde para falar e apreciar o mesmo assunto, Biochip. Todos comendo as comidas dos outros no mesmo momento em que falavam sobre a sua história com a alimentação viva.

Acho que o que mais me chamou atenção foram as palavras das pessoas lá na frente. Pessoas que inclusive não conhecia, pois não participavam das aulas desse período, mas que estavam ali por um propósito em comum que algum dia já tiveram contato. Elas me tocaram e me fizeram perceber o tanto que Biochip pode mudar as nossas vidas e com tão pouco. Agradeço cada um que compartilhou suas experiências e suas comidas comigo.


Conclusão do curso:

Eu entrei pra Biochip através de uma indicação de uma amiga, porque estava procurando uma matéria de design para fazer na faculdade. Ela me disse que era uma aula sobre vida e comida ao mesmo tempo, algo que tinha tudo a ver comigo, já que gostava de cozinhar e também de aprofundar assuntos relacionados a vida. Não deu outra e fiquei muito curiosa para entender como funcionava essa aula que era dada numa tenda no meio da floresta da PUC.

Nas primeiras aulas já consegui perceber que ali era um ambiente único e eu era privilegiada de conhecer aquele espaço. Com o tempo, consegui refletir mais sobre o mundo em que vivemos. Percebi que tem muito mais coisa errada do que pensava. Eu fui levada para outro mundo durante as aulas, aquele ideal para todos os seres humanos. Um mundo onde pequenas coisas do dia a dia são valorizadas, como a areia da praia, as conchas, as frutas, sementes, a natureza. Nós precisamos nos conectar mais com tudo isso, porque faz parte da nossa origem e simplesmente deixamos de lado por causa do sistema que nos é imposto. É fundamental que nós quebremos com isso diariamente, mas de fato é um trabalho árduo.

Acho que hoje posso dizer que valorizo mais as coisas simples da vida. Ainda tenho muito o que melhorar, mas vejo que já tomei um grande passo em relação a Lara de antigamente. Obrigada Biochip, Ana, pessoas que conheci ao longo desse período, por me ensinarem tanto com tão pouco e em tão pouco tempo. Realmente não é preciso de muito para ser feliz.

O menos é mais.