Daniel Massarani CONCLUSÃO 2016.1
9/5/2016
Passei esse último fim-de-semana sem internet, o que pra mim é uma loucura. E por isso, já comecei a semana com uma perspectiva muito diferente. Nessa segunda-feira, me permiti, até agora, sentir acima de tudo, portanto já estava sensibilizado o suficiente para me abrir à experiência com as conchas e conversar com elas. E que conversa…
Comecei explorando formatos e combinações. Sentado, produzi alguns padrões e desenhos com as conchas e senti que estava produzindo conhecimento, mas ainda não estava clara a mensagem das conchas para além de sua função estética. Porém, aprendi uma lição sobre equilíbrio. Em uma tentativa de fazê-las caberem nas costas da minha mão, reparei que as conchas dependiam dos meus músculos estarem relaxados para não caírem. E meus músculos só se relaxaram quando todas as conchas foram colocadas, provando a interdependência do homem com a natureza.
Depois, deitei para tentar ouví-las melhor e meus colegas ao meu lado começaram a conversar. Mas em vez de me distrair, a fala da Gilvanete só me ajudou mais a me conectar com as conchas. Sem saber, suas palavras se traduziram em poesia e uma observação me marcou, era algo como “as conchas precisam ser incomodadas pra produzirem pérolas”. Viajei com meus pensamentos e comecei a traçar paralelos com as relações humanas.
Foi aí que resolvi fechar os olhos e sentir as texturas das conchas, na tentativa de ler suas mensagens como um cego lê braile, o que me ajudou a recombinar imagens e memórias para criar novas conchinhas na minha mente. E percebi que havia completado minha experiência quando me perdi nos meus devaneios e as conchinhas deixaram de ser a mensagem para se tornarem o emissor. Elas haviam falado comigo.
16/5/2016
Agradeço ao aipim e à experiência coletiva de produzir a farinha pelo fato de ter aflorado em mim uma sensação de complementação emocional. Lidar com essas raízes primeiro individualmente e depois em duplas com o tipiti foi interessante para desencadear boas energias, cada vez provando mais como podemos nos comunicar com os nossos alimentos. Isso gerou em mim uma felicidade instantânea e uma sensação de saúde plena.
17/6/2016
Hoje eu vim para a tenda com uma energia muito pesada. E a ironia é quase óbvia de que mexemos com uma das coisas mais leves, a areia. Durante meu contato com ela, passei por uma jornada meio turbulenta. Eu demorei pra conseguir me comunicar com a areia, porque meus pensamentos bloqueavam grande parte da minha sensibilidade. Aos poucos, fui conseguindo conciliar e equilibrar tudo isso, e tive algumas epifanias, mas dessa vez não foi no âmbito criativo, mas no campo da organização mental.
Eu agradeço à areia pelo diálogo. Por abrir um espaço para me ouvir e para me indicar alguns caminhos. Eu desenhei caminhos desordenados na areia com os meus dedos e ela respondeu definindo caminhos ordenados quando a deixei deitar na minha mão. E isso foi muito importante pra mim. Seria exagero dizer que o contato com a areia me fez me sentir bem novamente por completo, mas com certeza apaziguou alguns fantasmas na minha cabeça e afastou pensamentos danosos.
Gratid ã o Final
Toda vez que eu venho pra tenda é como se eu tivesse sendo transportado para outro mundo. Parece inacreditável, mas tem alguma coisa no ambiente que me transforma e se transforma a cada aula. Cada atividade é sua própria dança de cores e odores e ter a oportunidade de vivenciar isso é algo que eu valorizo muito. Toda vez que entramos em contato manual com os ingredientes e participamos das etapas de confecção das comidinhas é realmente uma experiência coletiva e individual ao mesmo tempo. Além disso, o próprio conceito da tenda me intriga, esse lugar protegido da chuva, mas que se integra com o ambiente. O chão de terra, as ocasionais visitas dos miquinhos, as plantas invadindo o ambiente… Todo esse “escape da civilização” que não bloqueia exatamente os sons do trânsito na rua, mas os impede de penetrar na nossa energia.
Mais um aspecto que me inspira sempre são as suas falas e eu nunca deixo de colar elas bem forte na minha cabeça. Acho que às vezes pareço meio avoado porque fico fermentando as ideias e refletindo sobre elas por alguns minutos. O mesmo acontece com os filmes. Em dia de filme, que geralmente eram às sextas, só vinha à PUC para Biochip, então naturalmente o conteúdo dos filmes consumia todo o meu dia.
Levando tudo isso em consideração, relembrando todas as aulas e as gratidões, percebo que, mais do que qualquer coisa, eu aprendi a ser grato pelas coisas ao meu redor. Aprendi a ouvir a vida e ouvir melhor as pessoas, quando consegui ouvir as conchinhas. Aprendi a entender a minha capacidade de transformação quando entendi a capacidade de transformação da argila. Aprendi a conhecer meu tempo quando germinei as sementes e acompanhei o tempo delas. E por aí vai… espero que esse fluxo de descobertas não se encerre com o encerramento do semestre.