Julia Sá Nobrega CONCLUSÃO 2016.1
18 03
se você vai dizer não, não diga nada, só pense a respeito
tinha momentos que eu me sentia numa sessão de terapia, como se o filme estivesse comigo, de mim, da minha vida
me fazia entrar tão longe que eu me perdia nos meus próprios pensamentos, só que dentro do filme, das falas, das paisagens, da trama
o relógio
as árvores
o corpo
a física
uma troca de idéias, ideais, opiniões, conceitos, em que todos que estavam envolvidos ouviam, respeitavam, mesmo sem concordar
a troca de energia as vezes é tão forte que você não consegue desapegar, se desprender, se desconectar, se desgrudar
a despedida se torna difícil, você não quer
se você vai dizer não, não diga nada, só pense a respeito
eu to pensando no filme, mas parece que estou escrevendo sobre mim
acho que estou mesmo
muito feliz, agradecida, com amor no coração, pelo que essas aulas estão me fazendo sentir, produzir
as vezes a resposta é começar a amar aos poucos
21 03
eu percebi como eu tenho dificuldade de me comunicar com o meu corpo
hoje eu agradeço a corda de rami
um objeto que parece tão simples, bobo, simbolicamente pequeno, porém tão forte e que pode representar tanto
como os nossos próprios sentimentos
que as vezes são tão nossos e únicos e que por medo, vergonha, insegurança, desconfiança nos faz pensar que são bobos, menores do que são, menos fortes, menos potentes
a gente tira a potencia deles
em dupla foi fácil achar a posição da corda no corpo
“fácil”
isso nos deixou mais imóveis em primeiro momento, como se já tivéssemos alcançado o objetivo
para depois perceber que na verdade o objetivo era poder se mexer conforme o corpo pedia ou não, sair do conforto ou procurar novas zonas de conforto
passando por momentos de confusão, vontade de se comunicar verbalmente
para assim alcançar uma nova ocupação do espaço, com movimentos suaves, nunca estáticos, com novos pontos de vista
depois de muito se mexer, nós chegamos em uma posição por acaso, e instantaneamente meu corpo sentiu que tinha sido a melhor, mais bem recebida
eu ri, me expressei, externei essa sensação esse sentimento
ele foi recebido e foi recíproco
minha dupla também sentiu
incrível
os dois corpos funcionando como um só
só faria sentido assim
aos poucos esses desenhos passam a fazer mais e mais sentido
por isso eu agradeço
01 04
Hoje nós trabalhamos juntos, em tarefas individuais, para o grupo
cada um preparou um pouco de um alimento para que ele virasse cor
três alimentos, três cores
em certo ponto a gente esquece que as cores vem da natureza e não da cabeça do homem, das maquinas, do computador
foi importante perceber que não tem problema não saber fazer alguma coisa e poder perguntar, e as vezes chegar em uma conclusão em conjunto
sempre um trabalho em grupo, individual e para o grupo
cada vez mais existe e cresce a comunicação com poucas palavras, não verbal
a paciência, a observação, o companheirismo, o respeito
é um momento em que fala-se pouco com palavras, pela boca, mas tudo que é dito, ao mesmo tempo, é importante relevante, te faz pensar, é absorvido, passa a fazer parte de você naquele momento
o contato com o alimento, a troca de energia,
comer não só por comer, mas para agradar seu interior, seu corpo, nossas células
se alimentar e sentir o corpo sorrindo e agradecendo
“obrigado, eu estava precisando disso, me fez bem, agora pode seguir a sua vida que eu me encarrego do resto”
o corpo trabalha em grupo, individualmente, para o grupo
04 04
eu agradeço hoje pelos sentimentos bons que essa aula me proporciona
o contato com o alimento
o fato de não ter certo ou errado, apenas próprio para o nosso consumo ou próprio para a terra consumir
me fez refletir sobre os processos que os alimentos que passam por mim diariamente sofreram
sobre a felicidade que o alimento vivo traz
quando você sabe por quem ele passou, como foi preparado, de onde veio, a composição do seu corpo, suas células, seu DNA
você transfere aquela vida, potencia, energia, que estava nele para dentro do seu corpo, organismo, cabeça, coração, pernas, braços
da vontade de sorrir
11 04
Hoje eu agradeço à argila
à terra, à areia, à água, à vida, às bactérias
como o envolvimento com uma matéria tão simples, que é essa mistura de elementos que resultam na argila, pode ser tão grandiosa
mais uma vez o sentimento de gratidão, por um trabalho, um movimento, individual, com o grupo, para o grupo, resultando num final coletivo
difícil colocar em palavras tudo que eu senti nessa aula de hoje
foi sem duvidas uma das mais especiais
botar as mãos na terra, o corpo
vontade de passar a argila pelos braços, pescoço, colo, rosto
o conjunto final com as formas de cada um, com os sentimentos de cada um que foi colocado na argila
cada movimento me remetia a um sentimento, me arrepiava
senti cheiros, lembrei de sentimentos de felicidade, sentimentos internos, profundos, apertava a argila, rolava pela pele, me arrepiava, me emocionava
cada vez faz mais sentido estar aqui e me permitir sentir tudo isso
15 04 a beterraba sendo espremida no vuau parecia sangue denso sendo espremido do coração
|
a beterraba mexeu muito comigo
eu agradeço a abobora, pela textura da massinha final que ela forma depois de ter todo seu liquido puxado para fora
eu agradeço ao repolho por ele ser tão diferente
ele foi o menos gostado, o que causou mais desconforto ao paladar, o mais comentado
e que ao mesmo tempo nos ensinou sobre a cor lindíssima que ele tem a oferecer
agradeço ao inhame por apresentar sua cor apenas na forma liquida, pela sua textura e pela sua cor
agradeço às cores, pelo formato de cada micro bichinho, bactéria, molécula, que prende aquele determinado raio de sol e cria aquela determinada cor
a magia que essa experiência trouxe
preparar os alimentos, ralar as cores, ficar com as mãos pintadas de rosa
não queria lavar, queria mergulhar na bacia de beterraba e ficar rosa por inteiro
ralar as cores, bater, encontrar o liquido, encontrar a massinha
colocar essas cores para dentro do corpo pela boca
a sensação de estar sendo pintada por dentro
a imagem da língua, dentes, lábios, faringe, laringe, sendo tomadas pelas cores
meu corpo sendo energizado
a sensação de leveza, felicidade, harmonia
25 04
Eu agradeço à maça e à batata por terem características tão parecidas
por nos incentivar a quebrar novas barreiras geradas pelo preconceito, pela memória, pelo costume
agradeço ao pimentão pela cor que ele traz para a comida
agradeço à aveia, ao alho poro, à cebola, ao agrião, ao brócolis
agradeço à água
agradeço à panela de barro, à temperatura máxima que a nossa pele aguenta
agradeço ao preparo dos alimentos, ao fato de ter que cortar cada um de uma forma diferente, à organização de cada elemento em um recipiente diferente
agradeço ao exercício de paciência que esse processo traz, a calma que o corpo sente quando você se concentra em executar apenas uma tarefa delicada e simples
agradeço ao gosto picante da pimenta e ao gosto suave da maça
Julia Sá Nobrega G2
eu comecei o ano procurando identificação
em algum lugar em alguma coisa
eu estava me sentindo muito sozinha
única
de um jeito ruim
estranha deslcolocada desalocada
não via espaço pra mim pra crescer me transformar
não via espaço pra respirar existir sentir
de repente eu tava coberta de terra e grama
neblina ar água
lama
rolando
de cabeça para baixo
e eu dizia esse é o ano da terra
elemento terra
eu tive uma visão
eu senti a terra a força dela que vem de baixo e te sustenta e te segura
enraizada
que vem do chão
firme
verde e marrom
elemento terra
e eu disse disse e repeti
eu escrevi e reli
eu chamei pedi
rezei
me senti dissolvida a energia envolta de mim me puxando para baixo para o mais perto possível
virei terra virei grama virei água ar virei elemento
de repente eu tava sem sapato
porque não fazia mais sentido estar de sapato
eu só pensava isso
como eu tinha errado no sapato
e tirei sem pensar duas vezes
de repente o pé enfiado na terra
todo marrom
no meio da horta
horta que só tinha vida
se a terra tava seca tinha formigueiro se a terra tava molhada entrava por entre os dedos
eu senti eu vi eu pedi eu rezei
ano da terra
eu nunca me senti tão em contato com o planeta, com o sol, com a lua, com o mar
por dentro e por fora
é isso que a alimentação viva representa pra mim
o que vem da terra nutri meu corpo, nutri meu interior
as células antigas morrem e as novas nascem com um outro desenho, outra cara, outro conteúdo, outro dna
é um ciclo, uma troca
eu alimento a terra ela me alimenta
eu aprendi tanto
tão além do que eu poderia ter imaginado
e é tão difícil de explicar essa aula
o que acontece na tenda?
amor
como explica o amor?
como explica as frutas as cordas a argila a areia a panela de barro a farinha na peneira a peneira no telhado como explica as cores os sucos as massinhas o pão como explica as seis bacias de água para limpar a mão como explica o chão de terra como explica os kits de estojos as tabuas facas escovinhas raladores moedores como explica a tenda como explica tudo que a gente sente na tenda
como eu vou explicar tudo que eu senti lá dentro
não explica
sente
eu sinto
o dia todo
na pele no meu corpo no meu cabelo na minha orelha no meu pescoço nos meus
olhos nos meus pulmões na minha respiração
a areia
eu senti a areia
com o meu coração
eu encontrei ali
pedi pra virar areia ser uma delas
eu aprendi a escrever
escrever pra mim é quase uma reza
é a comunicação do silencio
só o lápis riscando o papel
a mão deslizando pela folha
o barulho da mão deslizando pela folha
a cabeça só mandando a mão desenhar as palavras
eu digo o que eu to pensando
pra pensar
pra mandar o comando para mão escrever
pra escrever
pra acompanhar com os olhos
pra checar se a mão escreveu o que eu queria
pra ver se ficou bom
pra modificar alguma coisa
pra reler
palavra por palavra
eu aprendi que a gente passa por mutações diárias
toda hora
toda hora que eu escuto alguma coisa nova eu estou sujeita a passar por uma mutação
as vezes não percebe de cara
a oportunidade aparece vem ao seu encontro
quem escolhe se vai sofrer uma mutação é você
você escolhe se vai se deixar ouvir escutar sentir pensar repensar reaprender refazer reolhar recomeçar
eu aprendi a rezar
que felicidade
como eu agradeço
se lembrar todo dia
repetir em voz alta as palavras de força
acreditar
mesmo quando parece que não faz sentido acreditar
se lembrar que mesmo assim você acredita
eu aprendi que eu posso ter orgulho de quem eu sou
que eu posso ter orgulho de quem eu me tornei
que eu posso construir a minha família
que eu posso não ter medo
que eu posso lutar
que eu posso acreditar
que eu posso amar
porque eu amo muito
eu encontrei esse lugar em mim de novo
do amor
eu voltei a amar
eu não tava amando
eu não tava me deixando amar
eu não tava me permitindo
isso me deixava tão triste
e eu sei amar
eu sei dar amor
eu sei me amar
eu reencontrei o amor em mim
que felicidade
ana
no carro indo pra horta você contou pra gente que seus amigos vão adotar uma criança
contou que estava fazendo uma cortina de arco Iris pra ela
contou que o nome ia ser Sol
aquilo ficou em mim
eu escutei esse nome com o coração
depois por coincidência ou não eu estive presente quando você mais uma vez contou essa historia
eu senti eu chorei
esse nome
Sol
olha a força que ele traz
o fogo
as cores
que cores lindas tem esse nome
o que seria da terra sem o sol
o que seria da lua sem o sol
a terra a lua
elas são tão especiais
a luz
o calor
que nome especial
o sol
eu senti esse nome em mim
eu olhei no espelho e vi esse nome
eu vi uma foto minha e vi esse nome
ana
acho que esse é o meu nome
sol
eu estava buscando por ele
pelo meu nome
eu senti que eu encontrei
eu estou passando por muitas transformações mutações
eu aprendi que as pessoas são mutáveis
é normal
você me ajudou a entender que isso é normal existe acontece é pra acontecer deve acontecer
você a tenda as pessoas as atividades os filmes a horta a comida os sucos!
faz parte do que é entender o mundo amar ter compaixão alma
eu sempre tive muitos medos
hoje eu sinto todo mundo pertinho de mim
eu falo com eles
eu deixo eles chegarem
eu quero conhecer eles
me comunicar
ah
a comunicação
que especial é a nossa comunicação na tenda
que coisa linda de se aprender
a se comunicar sem usar palavras
usando o silencio
sentir o silencio
sentir através do silencio
aprender no silencio
escutar no silencio!
ver
usar a visão os ouvidos o nariz
as mãos a ponta dos dedos
eu não posso esquecer disso
eu gosto do silencio
ele é muito importante
tem que ser confortável
é no silencio que se torna capaz a percepção do que está no seu entorno, envolta de você
é no silencio que se escuta, se ouve, ouve a natureza, o outro, você mesmo, seus pensamentos, o que você tem a dizer
é no silencio que existe a troca
dizer só o que precisa ser dito
porque precisa ser externado precisa sair e ser tátil palpável visto transparecido
dizer o necessário o que faz sentido ser dito